A proposta de extinguir a obrigatoriedade de frequentar autoescolas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), anunciada pelo ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), está gerando intensa repercussão no país. A medida, que ainda está em fase de análise pela Casa Civil, visa reduzir custos e flexibilizar o processo de habilitação para condutores das categorias A (motos) e B (carros).
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O modelo sugerido permitiria que o candidato à CNH se preparasse por conta própria, com estudo individual ou apoio de familiares habilitados, sem necessidade de cumprir a atual carga horária mínima obrigatória em autoescolas. Ainda assim, os exames teórico e prático continuariam sendo exigidos para a emissão da habilitação.
Segundo o ministro, o objetivo é tornar o processo mais acessível, especialmente em regiões do país onde o custo atual, que pode ultrapassar R$ 2.000, se torna uma barreira para muitos. Ele argumenta que o Brasil é um dos poucos países que ainda mantêm a obrigatoriedade das aulas em centros de formação. Em sua visão, flexibilizar o modelo brasileiro segue experiências adotadas em países como Estados Unidos, México e Argentina, onde o processo é mais livre e menos burocrático.
Reações do setor e críticas de entidades
A proposta, no entanto, não foi bem recebida por entidades ligadas ao setor de trânsito. A Federação Nacional das Autoescolas (Fenauto) classificou o anúncio como “surpreendente” e alertou para possíveis consequências econômicas e sociais da medida, como o fechamento de até 15 mil autoescolas em todo o país e a perda de cerca de 300 mil empregos diretos e indiretos.
A Associação Nacional dos Detrans (AND) também reagiu com preocupação, afirmando que não foi comunicada oficialmente sobre a proposta e que mudanças dessa magnitude precisam ser discutidas com cautela e profundidade. A entidade reconhece que o alto custo da CNH é um problema, mas destaca que a qualidade da formação de condutores deve ser preservada, especialmente em um país que ainda registra altos índices de acidentes de trânsito e motoristas não habilitados.
Especialistas divididos
O debate também mobilizou especialistas em mobilidade e segurança viária. Para Rodolfo Rizzotto, coordenador do programa SOS Estradas, a proposta pode gerar mais riscos no trânsito, ao criar uma cultura de impunidade e retirar a única etapa formal de formação dos condutores.
Já Roberta Torres, consultora do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), criticou a abordagem do governo, afirmando que o problema do sistema não está na existência das autoescolas, mas na falta de fiscalização, corrupção nas bancas examinadoras e no excesso de taxas cobradas pelos Detrans. Segundo ela, a proposta ignora a raiz do problema e representa um retrocesso na formação de motoristas.
Por outro lado, especialistas como o professor Rafael Roco, da PUC-RS, veem a proposta como uma forma de dar mais liberdade ao cidadão e corrigir distorções do sistema atual. Ele lembra que, antes da obrigatoriedade das autoescolas, o processo de habilitação era feito diretamente com as autoridades de trânsito, e que muitos candidatos já chegam com experiência prévia ao processo.
O professor Alexandre Rojas, da Uerj, também defendeu a iniciativa, afirmando que o fim da obrigatoriedade pode reduzir custos e tornar a CNH mais acessível, especialmente para famílias de baixa renda. Ele destacou, no entanto, que o serviço prestado pelas autoescolas continua sendo importante para quem precisa de apoio no processo de aprendizagem, e que elas poderão continuar existindo de forma facultativa.
O que muda e o que permanece
A proposta do governo prevê que os exames teórico e prático continuarão obrigatórios, mas a preparação formal em autoescolas passaria a ser opcional. A decisão final sobre a mudança depende da regulamentação do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e de uma eventual assinatura do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
A mudança, caso aprovada, começaria pelas categorias A e B. O Ministério dos Transportes justifica que, em cidades de médio porte, até 40% dos motoristas dirigem sem habilitação, e que o alto custo atual dificulta o acesso, sobretudo entre mulheres. Um estudo encomendado pela pasta apontou que 60% das mulheres em idade apta não possuem CNH, muitas vezes por decisões familiares que priorizam os homens, o que também reforça a desigualdade de gênero.
Cenário internacional
No exterior, os modelos de habilitação variam. Países como Estados Unidos e Argentina não exigem autoescola obrigatória, permitindo que os candidatos se preparem de forma independente. Já países como Alemanha, Japão e Rússia adotam regras mais rígidas, com obrigatoriedade de aulas teóricas e práticas em instituições credenciadas.
Próximos passos
A proposta deve ser discutida nas próximas semanas com a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) e o Contran. Entidades de trânsito e representantes das autoescolas pedem que o debate seja ampliado e que a qualidade da formação de condutores não seja prejudicada em nome da redução de custos.
Enquanto isso, o tema segue dividindo opiniões e promete ser um dos principais debates sobre mobilidade e segurança viária no segundo semestre.
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